quinta-feira, 31 de agosto de 2017

INAPTA / Divergente

Como alguns já sabem, me formei no Magistério em agosto de 2010. Desde criança, com 4 ou 5 anos, quando entrei no 'jardim de infância', eu ansiava pelo momento em que poderia dar aula, ensinar, transferir meu conhecimento para outros. Cresci brincando de dar aulas para bonecas e barbies, fazendo chamadas e preenchendo-as, escrevendo no quadro negro, fingindo que as bonecas me respondiam, umas com mais capacidade cognitiva que outras, tal como é na vida real. Inclusive, enquanto aluna, sempre tive facilidade em aprender e concluía rapidamente as tarefas, e, após, ao invés de ficar desenhando no caderno ou fazendo qualquer coisa para mim, ajudava os colegas, porque afinal alguns mereciam um apoio especial.
Então, com 14 anos, me despedi dos colegas que permaneceram no colégio, onde cursei da 5ª a 8ª série, e segui para o rumo que eu desejava desde sempre: o Magistério. É bem verdade que, ainda no Ensino Fundamental, eu cogitava fazer Arquitetura, já que tinha extremo apreço por desenhos de casas e maquetes, mas o Magistério era o primeiro passo, era a primeira profissão que eu queria ter. Foram 4 anos de muitos aprendizados e 'pagações de micos', vestindo-se com fantasias, brincando com as crianças, contando histórias, entregando folhas de plátano na sinaleira no Dia do Meio Ambiente e, lógico, enfrentando as diferentes crianças que conheci nas práticas pedagógicas.
Dos 14 aos 18 anos, obviamente tive diversas mudanças internas e externas. Comecei a me infiltrar no universo do rock and roll e a sair nas noites, comecei a me aproximar da mulher que eu realmente queria e deveria ser, amadureci.
Durante o estágio do Magistério, passei por algumas dificuldades, as quais provavelmente minhas colegas se depararam também. Ora, se até os pais dos alunos tinham certa desconfiança com as 'estagiárias', como os alunos não teriam também? Crianças testam os adultos, para ver até onde eles permitem que elas 'tomem conta'. Mas eu sobrevivi, as 400hs do estágio me tornaram mais confiante, forte, com mais voz de comando, mais decidida, evolui. Ao ponto dos pais desejarem que eu permanecesse com a turma até o final do ano, porém, infelizmente, por cursar Arquitetura e não uma Licenciatura qualquer, não era permitido. Me despedi dos pequenos, dos quais sinto saudades, mas sinto imenso orgulho de ver os jovens que são agora. Após a formatura, sem ter mais a obrigação de 'manter a bela imagem de professora', tingi o cabelo de vermelho.
18 anos? Eu precisava trabalhar, com algo que desse dinheiro, afinal o estágio não era remunerado. Me inseri no Programa Mais Educação, na mesma escola, dando aulas de ping-pong, recreação e matemática. Ao longo dos meses que participei do projeto, essa era a minha profissão: professora e monitora (e os alunos adoravam meus longos fios vermelhos, sem preconceitos).
Porém, eu queria mudar os ares. Não nasci árvore, não crio raízes; nasci folha, pronta pra seguir o curso do vento. Me inseri no mercado gráfico, no design, na arte digital, nas brigas diárias com impressoras e na lida com alguns clientes. Foram incríveis anos da minha vida, aprendi muito, adquiri novas aptidões artísticas, obtive mais conhecimento técnico em diversas áreas, conheci incríveis pessoas e profissionais. Resolvi trocar de graduação, a Arquitetura já não me satisfazia mais, não era o meu mundo, como achei que seria. Embora eu fosse muito boa nas ciências exatas, resolvi procurar um lugar onde eu me encaixaria melhor. Encontrei a Fotografia , meu lugar, todos colegas eram tão parecidos comigo, tudo tão agradável, divertido, prazeroso. Fotografar eventos e conhecer dezenas de pessoas num mesmo dia é algo tão interessante que mal consigo explicar. Observar as sensações das pessoas fotografadas ao verem o resultado do trabalho é incrível.
Mas a vida dá reviravoltas, claro. Fui desligada forçadamente do ramo gráfico e fiquei apenas com alguns trabalhos por conta própria, mas ainda não suficientes pra me manter financeiramente... precisava juntar mais algum dinheiro para então abrir a minha empresa da forma como sonhei. Eis que surge uma oportunidade: me chamam no concurso do Magistério. Parti em busca dos documentos, exames e toda essa parte burocrática. Nos exames de saúde, tudo perfeito. No exame psicotécnico, nem tanto. Me ligaram no mesmo dia, numa sexta-feira (por que estragar o final de semana das pessoas?), "vamos marcar a segunda avaliação". Me deprimi, fiquei triste, mas "vamos lá!". Fiz a segunda avaliação, individualmente, mas, no dia seguinte me ligaram "vamos marcar a terceira avaliação". Fiquei mais uma vez triste e deprimida e pensei comigo mesma "eles não vão me passar...". E, vejam só, fiz a terceira avaliação, algumas perguntas (para as quais sempre dei respostas sinceras, como a pretensão de abrir um estúdio num futuro não tão distante) e o famoso teste de manchas, Rorschach (para o qual dei inúmeras respostas, após saber que o importante era quantidade e não 'o quê' eu via), e depois de todo longo processo, com duração de aproximados 20 dias, me deram o resultado final: INAPTA.
Eu já sentia, já sabia. "Olha aquela menina ali, cabelos vermelhos, tatuada, de personalidade forte, fotógrafa (?). Não é esse o perfil de uma professora para crianças da Educação Infantil". É, eu também acho, concordo com as psicólogas, ser professora não é mais o sonho da minha vida, mas já foi, sou qualificada, e com certeza fui e seria novamente uma ótima professora... Mas, também não sou tão forte assim, então fiquei novamente deprimida após o resultado.
Mas o meu abatimento está passando. Ontem assisti o filme Insurgente (segunda parte do filme Divergentes), onde a população é subdividida em cinco facções: abnegação (sinônimo de altruísmo, quando a pessoa se importa mais com os outros do que com ela própria), amizade (referente às pessoas bondosas e generosas), audácia (para as pessoas corajosas, que se arriscam, sem medo), franqueza (para as pessoas extremamente honestas e sinceras) e erudição (referente à inteligência). No filme, as pessoas com mais de uma aptidão são consideradas divergentes, elas não se encaixam no padrão da sociedade e por isso são uma ameaça. Eu não me encaixo nos padrões para ser uma professora e por isso julgam que não sou adequada para tal. Contudo (alerta de spoiler), ao final do
filme se descobre que tudo não passava de um experimento, onde os divergentes (que eram a ameaça naquele 'mundo') eram na verdade a solução da humanidade. Eu ajudo o máximo de pessoas que consigo (e gosto disso), sou uma boa amiga (pelo menos assim o dizem), sincera (até demais), inteligente (digamos que eu costumo ter notas muito boas) e sou audaciosa (já fiz cursos de defesa pessoal, mecânica, volto sozinha pra casa às 23hs, enfim). Eu sou uma divergente, pertencente às cinco facções. Posso não fazer sentido para as pessoas quadradas de determinadas posições sociais, profissões e empresas. Mas eu sou essencial :)

Viviane Lauck

terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

1 ano+ de Independência ou Morte

Eu já tinha a intenção de escrever esse texto quando completou um ano da minha saída da casa dos pais, em final de novembro, porém as multitarefas não me permitiram.
Sobre estar morando sozinha há mais de um ano, adquiri diversas experiências e aprendizados.
Nada é como eu imaginava, mas sem sombra de dúvida foi uma decisão que valeu à pena.
Sempre pensei que a minha fase de vida solitária começaria com o clássico colchão atirado no chão e as coisas sendo moldadas aos poucos, conforme o dinheiro for permitindo. Parcialmente, foi assim. Porém a cama foi um dos primeiros móveis que surgiram, minha mãe ficou com pena das minhas pernas e costas por me imaginar dormindo no chão. Acidentalmente, acabou destruindo uma das minhas pequenas utopias.
Me diverti muito ajeitando o meu apartamento, e como é bom poder chamá-lo de 'meu'. Praticamente nenhuma parede está como no início, pintei quase todas, de cores que me agradam, embora mexam com a labirintite da minha mãe, que me ajudou muito no processo. E confesso que também foi divertido passar algum tempo lavando a louça no tanque ou no banheiro, pela inexistência de pia e torneira na cozinha; bem como as noites dormindo escorada em uma almofada no chão, pela inexistência de sofá, inclusive dividindo essa pequena almofada com alguns visitantes. Lavar roupa à mão não foi divertido.
Porém as duas primeiras semanas foram complicadas, a solidão bateu forte. Nem tanto pela falta de 'alguém' morando comigo, mas pela 'falta do que fazer'. Me mudei no impulso, concretizando meu desejo adolescente. Isso incluiu não ter internet e nem se quer um aparelho de televisão funcionando. Foi uma época que quase remetia aos anos 50, onde as pessoas tinham como lazer apenas ouvir músicas em aparelhos de som. Um tempo depois adotei a minha baby felina, a pequena Dorothy, que, embora faça uma bagunça alucinada, também contribui me fazendo companhia.
Morar sozinha é um The Sims da vida real, e sem manhas como motherlode, que, não por acaso, tem um 'mãe' incluso na palavra. É aterrorizante ver o salário escorrendo pelo ralo, ao quitar contas de luz, condomínio, internet, faculdade e afins. A última opção é sempre a comida, onde se faz compras com o que 'sobra' do dinheiro. Certo mês fechei com apenas R$ 40,00 em conta e com os suprimentos terminando. Minha mãe questionou "mas por que tu não pediu ajuda?". Oras, não saí da casa deles para continuar dependente, se a intenção fosse essa, não teria porque sair, já que sempre foram tão confortantes e acolhedores. Porém, até então tem ocorrido tudo muito bem, inclusive com algum dinheiro sobrando 'em caixa' no momento.
Um ano é tempo suficiente para aprender que nada volta pro lugar sozinho, que a poeira vai continuar ali se você não limpar (causando espirros intermináveis para quem tem rinite, como eu), que as roupas também não se lavam sozinhas (e tampouco ficam lisinhas sem passar o ferro quente), que a geladeira dificilmente vai estar cheia (e muitos alimentos vão estragar por uma pessoa só não dar conta até a data de validade passar), e que a habitação parece nunca chegar ao patamar que você quer.
Há cerca de um ano, eu decidi que estava na hora. O apartamento estava encaminhado, os móveis essenciais já estavam devidamente posicionados, o local clamava apenas por uma presença humana.
A ideia inicial era realizar a mudança em dezembro, algo como um 'presente de aniversário de mim para mim mesma', mas acabei antecipando. Acreditava que, morando no meu canto, conseguiria arrumá-lo com mais afinco, terminar de pintar as paredes, as portas, rodapés, conseguir visualizar melhor onde gostaria de colocar cada móvel imaginário... Doce ilusão de menina. Passou-se um ano e ainda tenho portas por pintar, móveis para comprar e praticamente nada está como eu imaginava.
Me decepciona um pouco ver os móveis todos diferentes, nenhum combina com o outro, como eu gostaria e imaginei que seria. Mas eu idealizava também um apartamento cheio de farra, festa e amigos, sobretudo por estar situado em uma região central da cidade. Outra mera ilusão. Para adquirir um imóvel é preciso dinheiro (muito dinheiro), e para conseguir tal feito é necessário trabalhar (muito, também), e, trabalhando muito, é também imensamente difícil manter todas as suas amizades em dia. Um pouco frustrante, eu diria.
Hoje, com 25 anos, sinto-me próxima da rotina que eu queria tanto ter. Jornadas intermináveis de trabalho árduo, aliados aos estudos e à poucas horas de sono. Mas confesso, é muito mais complicado e desgastante na prática. Pensava eu que esta seria minha melhor idade, jovem, com certas aquisições e energia para também curtir a vida. Outra ilusão. O cansaço faz parte também do meu dia-a-dia.
Enfim, muito embora o último aniversário tenha sido o pior de todos, estou otimista com o ano de 2017. Com moradia e automóvel próprios (a herança do vô ajudou aqui) e pretensões de me formar na graduação, a tendência é que tudo melhore :)